Nulidade de algibeira e a jurisprudência do STJ

A estratégia processual conhecida como “nulidade de algibeira” ou “nulidade de bolso” tem sido recorrentemente analisada e rejeitada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) no contexto jurídico brasileiro. Essa estratégia envolve uma parte que, ciente de um suposto vício ou irregularidade no processo, opta por não se manifestar imediatamente, deixando para alegar a nulidade em um momento mais conveniente para seus interesses. Essa prática é contrária aos princípios consagrados no ordenamento jurídico brasileiro, como a lealdade, a boa-fé processual e a cooperação entre as partes.

Em diversos julgamentos, ministros do STJ reforçaram a posição de que a jurisprudência dos tribunais superiores não tolera a chamada “nulidade de algibeira”. Isso significa que a alegação tardia de nulidade, somente após a ciência de um resultado desfavorável, é vista como uma manobra processual que não está de acordo com a boa-fé processual.

A origem da expressão “nulidade de algibeira” e do entendimento jurídico correspondente é creditada ao ministro Humberto Gomes de Barros, do STJ, que a utilizou pela primeira vez em 2007. Um caso paradigmático que ilustra essa prática é o do REsp 756.885, em que a parte alegou a nulidade da intimação apenas em momento posterior, sem demonstrar prejuízo ao exercício da ampla defesa.

Além de casos relacionados a vícios de intimação, o STJ identificou a “nulidade de algibeira” em diversas outras situações. Por exemplo, em um caso envolvendo um banco que tentou anular uma citação com base em argumentos não manifestados anteriormente. O tribunal também reconheceu essa estratégia em casos de alegações tardias de nulidades relacionadas à intervenção do Ministério Público, oitiva de testemunhas, formação de comissões em processos administrativos disciplinares e outros contextos.

Em resumo, a “nulidade de algibeira” é uma estratégia processual desaprovada pelo STJ, que envolve a alegação tardia de nulidades ou vícios processuais em busca de vantagens estratégicas no processo. Os tribunais superiores exigem que as partes se manifestem imediatamente ao tomar conhecimento de irregularidades, em respeito aos princípios da lealdade, boa-fé processual e cooperação no sistema jurídico brasileiro.

Aplicação no Processo Penal

Em dezembro de 2022, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) rejeitou um agravo em recurso especial (AREsp 2.204.219) com base na consideração de que a alegação tardia de nulidade na oitiva de testemunha, com o intuito de reverter um resultado desfavorável, evidencia o uso da estratégia processual conhecida como “nulidade de algibeira.”

No caso em questão, a defesa buscava reverter uma condenação por tráfico de drogas. Argumentou junto ao STJ que não concordou com a inversão da ordem da oitiva das testemunhas durante a audiência de instrução e julgamento. No entanto, notou-se que nos próprios autos do processo ficou evidente que a defesa havia concordado com a realização posterior da oitiva de uma das testemunhas de acusação, sem levantar qualquer questionamento sobre nulidades nas alegações finais. A questão foi trazida à tona somente no recurso de apelação.

O relator do recurso, ministro Rogerio Schietti Cruz, enfatizou que o comportamento da defesa, que concordou com a realização da oitiva da testemunha sem alegar nulidades nas alegações finais e só posteriormente contestou o procedimento, demonstrou claramente a tentativa de aproveitar-se da chamada “nulidade de algibeira.” Isso significa que a defesa guardou essa alegação estratégica para ser usada apenas em um momento mais conveniente, após a ciência do resultado desfavorável, o que não se coaduna com a boa-fé processual. Portanto, o recurso foi rejeitado com base nessa consideração.

“Como decorrência do disposto no artigo 565 do Código de Processo Penal e tendo em vista a proibição de comportamento contraditório da parte (venire contra factum proprium), não se reconhece nulidade a que deu causa a própria parte”, concluiu o relator.

Notícias do STJ 03/09/23

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